Fotografei-te
num dos velórios dos meus sonhos.
Tornou-se
isto o meu quotidiano, a romaria tradicional às minhas pequenas mortes.
Felizmente que são sempre outros rostos
a sepultar-me com salmos diferentes.
Sinto-me muitos e popular,
com vários nomes registados no cartório
à revelia do pai.
[mas todos filhos da puta.]
Se pudesse existir um mercado funerário
só para as minhas ilusões,deixaria de sonhar
para me poupar à vergonha
de pagar para enterrar os meus ensaios nulos.
Morrer é caro e eu não daria um tostão
para ocupar a terra com derrotas.
Nem me disseste adeus.
Nunca quiseste saber qual era a minha esperança média
de morte.
Foste só mais uma voz no coro
a entoar um requiem,
ou a rezar o terço com a boca cheia de devoção.
Mas devo-te o reconhecimento do mérito:
foste a primeira, e serás a última,
a dizer graças a deus quando recebias a minha unção.
[Cheguei a
acreditar que era um Eleito.
Só mais tarde soube que eras missionária de uma
religião universal.] De resto, foste só mais uma oração
que serei obrigado a esquecer
para nunca deixar de acreditar
na falsa salvação que se segue.
Nos meus lábios,
os teus beijos cumprem pena de prisão domiciliária.
É esta a medida de coacção a que fui sujeito
desde que cometi o crime de te beijar.
Se me perguntarem,
direi que amar-te está em segredo de injustiça.
VS
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